Economia
“Não se prevê que 2025 venha a ser um ano fácil nem para a economia nem para o setor”
Rafael Campos Pereira, vice-presidente da AIMMAP antevê um ano de desafios para o setor, desde logo pelo cenário europeu e mundial. Na entrevista ao OPINIÃO PÚBLICA, o responsável acredita na resiliência e coragem das empresas portuguesas, que, apesar de sofrerem com a falta de mão de obra qualificada, estão, na sua opinião, na vanguarda do investimento em qualidade, inovação, tecnologia.
OPINIÃO PÚBLICA: O setor metalúrgico e metalomecânico atingiu, em 2023, um novo recorde nas exportações. O ano passado esse crescimento abrandou e estagnou. O que é que significam estes números?
Rafael Campos Pereira: Em 2023, o setor bateu o recorde de exportações, que atingiram os 24.017 milhões de euros (+4,1% face a 2022). Este indicador que, tal como alguns outros que caraterizam o setor, representa aproximadamente a terça parte do respetivo indicador para a indústria transformadora em geral, em cerca de uma década mais do que duplicou, o que representa um facto verdadeiramente notável. Os valores finais do ano de 2024 ainda não são conhecidos, mas o ano deverá terminar ligeiramente abaixo do ano anterior.
Na verdade, os desafios que se põem atualmente à indústria, são muitos e diversos, desde as disrupções ao longo das cadeias de valor e abastecimento, a excessiva e desarticulada regulamentação europeia, os cenários de guerra na Ucrânia e em Gaza, e o novo cenário político nos EUA, que permite antever uma política altamente restritiva de acesso àquele mercado. A economia americana continua a ter um fortíssimo impacto na economia global, desde logo pela dimensão interna, mas também pelo peso geopolítico daquele país. As medidas protecionistas de Trump podem contribuir para aumentar os preços e estimular a inflação nos EUA – o que poderá levar a uma política monetária mais apertada, o que por sua vez pode acabar por levar à subida das taxas de juro europeias. O cenário de incerteza associado às taxas de juro mais elevadas teriam certamente consequências negativas para o crescimento do continente europeu.
Além disso, os resultados que se prevê para 2024 significam que estamos a pagar o preço das crises instaladas nos nossos três principais parceiros comerciais. A Espanha enfrenta uma enorme instabilidade política, a França acrescenta às convulsões políticas um défice público preocupante e a Alemanha, para além das dificuldades em garantir soluções de governo estáveis, atravessa uma crise profunda nos principais pilares da sua economia.
Os problemas gravíssimos que a indústria automóvel alemã enfrenta refletem-se em todas as cadeias de abastecimento europeias, não sendo Portugal uma exceção.
Neste contexto, não se prevê que 2025 venha a ser um ano fácil para a economia portuguesa nem para o setor metalúrgico e metalomecânico.
Mas quais as perspetivas em termos de oportunidades para 2025?
A experiência empírica habituou-nos a confiar na resiliência e na coragem das nossas empresas, que têm surpreendido ano após ano, ultrapassando obstáculos e constrangimentos muito difíceis e sobrevivendo a sucessivos choques. Naturalmente, a nossa esperança é a de que uma vez mais seja possível resistir com sucesso às adversidades.
No entanto, estamos cientes que 2025 será um ano desafiante e imprevisível, até porque a Europa enquanto bloco, continua claramente a perder importância em termos económicos, políticos e até culturais.
As lideranças europeias mostram muito pouca ambição e coragem política, no sentido de implementar medidas fundamentais geradoras de competitividade económica e capazes de criar melhores condições devida para os seus cidadãos.
Portugal afirma-se como fornecedor de excelência para setores consolidados, como o automóvel e aeronáutico. Considera que está preparado para explorar novas oportunidades?
Sim, sem dúvida nenhuma. Um bom exemplo é o facto de as empresas do METAL PORTUGAL estarem perfeitamente qualificadas para serem fornecedores prestigiados do exigente cluster da defesa, por exemplo, que é hoje uma prioridade europeia. Aliás, a AIMMAP tem apoiado o setor a posicionar-se nesse sentido.
No que diz respeito às políticas de Economia, muitos setores acusam os sucessivos governos de não tomarem medidas para o crescimento, nomeadamente que apoiem as empresas em vez de lhes complicarem a vida… Falamos, designadamente, de energia a preços competitivos, o combate à burocracia, a diminuição da carga fiscal, entre outros. Considera que o Orçamento de Estado para este ano satisfaz as mais de mil empresas que a AIMMAP representa?
A nível nacional, a resposta aos grandes desafios tem chegado tarde e de forma tímida, principalmente em comparação com vários países europeus que estão a despender avultadas somas na proteção da sua indústria, com consequências a nível do level playing field que se deveria observar no mercado interno europeu.
Entrando em linha de conta com todo este enquadramento, o OE para 2025 desilude desde logo pela falta de coragem política para uma verdadeira mitigação do pesado e complexo quadro fiscal. Nomeadamente, a nível de salários o esforço não pode ser só suportado pelas empresas, mas deve também ser responsabilidade do Estado, diminuindo a carga fiscal que incide sobre os salários, aumentando assim o rendimento disponível das famílias.
Para as empresas se manterem competitivas precisam de trabalhadores qualificados e que haja um aumento do rendimento disponível dos trabalhadores sem sobrecarregar excessivamente as empresas e sem onerar o Tesouro.
Por outro lado, a redução no IRC ficou aquém do desejável. Não faz sentido que se penalize de forma agravada os grandes e ainda menos que se coarte aos pequenos a ambição de serem grandes. Com o atual edifício fiscal, é inexistente o incentivo para crescer, para aumentar o investimento, para atrair IDE.
Além disso, numa altura em que a competitividade da economia está na ordem do dia na agenda das grandes preocupações de política económica nacional e europeia, Portugal continua a enfrentar problemas estruturais complexos e que afetam gravemente a atividade empresarial e o crescimento económico.
Assim sendo, quais são os principais desafios futuros para o setor?
A produtividade e a inovação são a chave para colocar a economia nacional na corrida da liderança. O comportamento do Estado está a ancorar a economia nacional, capturando-lhe recursos essenciais para diferenciar pela inovação, tecnologia e escala. Na verdade, entre os problemas que mais afetam a vida das empresas e dos cidadãos portugueses merece destaque a presença de uma máquina pública pesada, burocrática, desconfiada, hostil e asfixiante.
É fundamental que o poder político compreenda que o salto para a competitividade passa obrigatoriamente pela criação de um ambiente de negócios e regulamentar que convide a mais e melhor investimento, mais e melhor inovação, mais valor acrescentado, vendo sempre o mercado global como sendo o mercado natural da indústria nacional cuja qualidade é há muito aplaudida em todo o mundo.
Mais do que um sistema de incentivos, aquilo que a economia nacional precisa realmente é de não lidar diariamente com um verdadeiro sistema de desincentivos que nasce na máquina pública, caso contrário será difícil salvar Portugal de um penoso processo de desindustrialização.
A acrescer a tudo isto temos ainda um volume impressionante de regulamentação europeia, que o estado português consegue levar por um caminho ainda mais penoso, polarizando, fragmentando e criando várias divergências. Um cenário insustentável para a sobrevivência empresarial.
O setor, a par de outros, sofre com a escassez de mão de obra qualificada?
Portugal continua a enfrentar problemas estruturais com uma forte pressão de escassez de população disponível para a vida ativa, investimento insuficiente e produtividade reduzida que restringem o potencial de crescimento da economia.
As empresas têm identificado este ponto como uma importante limitação ao crescimento. A questão da atração e retenção de talento exige obviamente um grande esforço das entidades privadas, o que já está a acontecer, mas esse esforço tem obrigatoriamente de ser acompanhado pelas políticas públicas, quer ao nível fiscal, permitindo criar melhores condições salariais, quer no que respeita a políticas de formação e qualificação, quer no que respeita ao contexto económico e social no sentido mais lato. A tudo isto acresce a necessidade de uma política de imigração adequada às reais necessidades do país.
Também a este respeito, o OE para 2025 falha ainda por não refletir uma aposta na qualificação de recursos humanos. A modernização e a digitalização das empresas são fundamentais para podermos entrar no campeonato do valor acrescentado. A economia portuguesa tem de ser capaz de valorizar a indústria e investir, com o apoio de políticas públicas capazes de aumentar o crescimento económico pelo valor acrescentado.
O que é produzido em Portugal por este setor tem qualidade?
As nossas empresas são hoje fornecedoras privilegiadas de muitos grandes grupos mundiais, que reconhecem estar perante empresas de um setor que, para bater o recorde das exportações, bate muitos outros recordes, estando na vanguarda do investimento em qualidade, inovação, tecnologia, formação, bem como em padrões de sustentabilidade cruciais no posicionamento do setor, que todos os dias escala para níveis superiores em mercados de extrema exigência e sofisticação.
A vossa associação propõe-se projetar um setor “forte e robusto” para um patamar superior. Isso tem sido feito? De que forma?
E é exatamente isto que a marca METAL PORTUGAL representa. Uma marca feita e pensada para a Internacionalização, que define a imagem do setor nos quatro cantos do mundo.
Globalmente, as empresas portuguesas estão muito bem posicionadas, e pelos elevados padrões que têm, associados a um grande sentido se adaptação, tendo nomeadamente capacidade para produzir pequenas séries, beneficiam dos ajustamentos e estratégias de nearshoring implementadas nos últimos anos pelos grandes grupos europeus.
Nos próximos anos acredito que o setor vai continuar a crescer além-fronteiras, quer nos mercados tradicionais, quer em novas geografias. E a estratégia para isso, é reforçar a aposta no conhecimento e na formação, na inovação e no desenvolvimento tecnológico, numa economia cada vez mais circular, e reforçar cada vez mais os critérios de sustentabilidade quer a nível ambiental, quer a nível social. Neste caminho, a AIMMAP tem tido um papel determinante para as empresas do setor, pelas diversas iniciativas que têm promovido alinhadas com os cinco grandes objetivos estratégicos identificados na “Visão Estratégica 2030 do Setor Metalúrgico e Metalomecânico”: mais crescimento; mais produtividade; mais sustentabilidade; mais capacitação; mais imagem.
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