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Paulo Cunha em entrevista: “O eixo da minha roda será sempre Famalicão”

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Depois das eleições europeias, realizadas a 9 de junho, os 21 eurodeputados portugueses – dos quais 20 foram eleitos pela primeira vez – começam já a instalar-se em Bruxelas. A tomada de posse só começa a 16 de julho, em Estrasburgo, mas muitos dos 720 eurodeputados já avançaram para o primeiro contacto com a instituição.

É o caso do famalicense Paulo Cunha. O número dois da lista da Aliança Democrática já está em Bruxelas e horas antes da sua partida, numa entrevista ao OPINIÃO PÚBLICA, falou das suas expetativas em relação aos cinco anos de mandato.

OPINIÃO PÚBLICA: O que é que representa para si este novo desafio?

Paulo Cunha: Quando há três anos saí da Câmara Municipal, saí sem propósitos políticos, saí para regressar à vida profissional que tinha antes de iniciar o meu percurso autárquico. Quis um conjunto de circunstâncias que foram acontecendo que o presidente do meu partido, Luís Montenegro, me lançasse este desafio de integrar uma lista que foi encabeçada pelo Sebastião Bugalho e eu achei o projeto interessante. Percebi que era possível colocar muito da minha experiência pessoal, cívica, política e profissional ao serviço do desempenho da função e entendi que era possível fazer algo de melhor e de novo pelo meu país, pela minha região, pelo o meu distrito e pelo meu concelho. Espero poder corresponder às expetativas que as pessoas têm acerca do desempenho do meu mandato.

Li uma frase sua, nas redes sociais, a propósito desta eleição, que foi um dos dias mais felizes da sua vida. Trata-se, naturalmente, de uma grande conquista a nível político…

Sim, é uma grande conquista. Se me perguntasse há um ano se antecipava isso como possível, eu diria que não, porque estamos a falar de 21 personagens em Portugal que são chamadas a uma tarefa de grande responsabilidade no contexto europeu, numa Europa cada vez mais exigente. Há uma guerra na Europa, as migrações, instabilidade, insegurança, volatilidade económica… circunstâncias para quem for chamado ao desempenho desta função terá responsabilidades acrescidas. Portanto, longe de mim pensar que eu seria escolhido, primeiro pelo meu partido, depois eleito pelos portugueses, para desempenhar este cargo, ainda por cima num lugar de grande responsabilidade, por ser número dois da lista, o primeiro militante do PSD, sabendo que Sebastião Bugalho é independente… São condições que eu poderia dizer, antecipadamente, que não se iriam cumprir, mas aconteceram e por isso expressei essa felicidade.

Que contributo espera dar no Parlamento Europeu? Estamos a falar de 720 deputados de circuitos e sensibilidades diferentes, famílias políticas diferentes…

São 720 eurodeputados e fazendo um paralelismo com a Assembleia da República, onde existem 230, as pessoas poderão ser levadas a pensar que no Parlamento Europeu cada um, individualmente, pode fazer muito menos do que faz na Assembleia da República. É mentira, é exatamente ao contrário, e por isso é que aceitei o desafio. É perfeitamente possível que um em 720 possa fazer um trabalho que seja profícuo, que tenha resultados, que seja visível, que seja imensurável, que seja palpável, que as pessoas possam percecionar o trabalho daquele eurodeputado, que faz parte daquele partido político, que está integrado num grupo político, que é o PPE [Partido Popular Europeu], que representa um país. Somos todos deputados europeus e queremos todos defender esta velha Europa tão marcante e socialmente tão gratificante. É um espaço privilegiado, mas é preciso trabalhar para que este espaço não perca essa qualidade e os europeus continuem a querer viver na Europa e continuemos a cativar cada vez mais pessoas que queiram viver junto de nós e ajudar-nos a construir esta Europa mais forte. O meu grande desafio é, ao mesmo tempo, ajudar a Europa a ser mais Europa, Portugal a ser mais parte da Europa e influenciar mais o pensamento europeu e colocar neste puzzle a região, particularmente o Minho, mas o meu distrito e o meu concelho, que é Famalicão.

Que conhecimento é que tem do funcionamento, da dinâmica do Parlamento Europeu? 

Há uma parte que não é novidade, a minha formação em direito ajuda-me a conhecer a sua constituição. Do ponto de vista político, é bom não ignorar que os autarcas têm que ter conhecimento do que é a pirâmide governativa a nível global  e europeu, sabendo que nós dependemos cada vez mais da Europa, 90% do investimento português vem de Bruxelas. Acresce a tudo isto que há um conjunto de aspetos que eu não dominava, mas estou agora a introduzir-me a eles e é uma vertigem de situações novas que estão a acontecer e em poucas horas ou dias fui obrigado a gerir um conjunto de dossiers. Aproveito para dizer que fui indicado para chefiar a delegação portuguesa no PPE, o que significa que sou o responsável máximo dos eleitos portugueses ao Partido Popular Europeu, o que me traz um conjunto de outras obrigações, o que fez com que rapidamente tivesse que entrar nos novos dossiers…

Neste momento decorrem as negociações para que os eleitos ou reeleitos consigam os lugares que desejam nas várias comissões parlamentares. Há alguma comissão a que gostaria de pertencer?

Há duas comissões que gostaria de integrar. Uma tem a ver com direitos de cidadania e questões ligadas às migrações. A outra  é uma comissão ligada à indústria, investigação e energia…

E aqui está o vínculo a Famalicão…

Admito e não escondo que a da indústria me agrada particularmente, tendo em conta a relação com Famalicão e o conhecimento autárquico que me proporcionou acerca deste tema e do quanto é relevante mantermos este marca industrial num contexto em que há uma chamada fobia dos países pela indústria e que só apostam nos serviços. Até Portugal tem apostado cada vez mais no turismo, nada contra isso, mas é preciso não desacelerar o investimento na indústria, sabendo que tem um peso significativo na capacidade produtiva de um país e na sustentabilidade da qualidade de vida na Europa. Entendo que a indústria ainda é o principal motor, capaz de proporcionar essa sustentabilidade futura do crescimento económico europeu. É preciso registar que a Europa está a perder fulgor, quando comparada, por exemplo, com a Ásia Central e os Estados Unidos. O facto da Europa ter que reganhar competências fez com que eu, antecipadamente, apresentasse credenciais para integrar essas duas comissões. Procuro convencer os meus parceiros que aceitem esta minha indicação, sendo que se isso for concretizado ficarei muito satisfeito…

Na verdade, a Europa tem pela frente, nos próximos cinco anos, desafios que podem marcar o seu futuro e que exigirão novas capacidades de negociação e de decisão. Dois desses grandes desafios são a guerra na Ucrânia e a política de imigração. Foi aprovado um novo pacto para as migrações e os refugiados. Aparentemente, no debate público, poucos se reconhecem nele. Aceitam-no como um mal menor que não resolve qualquer dos graves problemas associados às migrações. É também a sua perceção?

Sim, é. Nós somos frontalmente contra o conceito Europa fortaleza, que é a ideia que as fronteiras estão fechadas, que é só para os europeus… Defendo que tem que se abrir as fronteiras. Seria demagógico, populista e irrealista dizer o contrário, até pela tradição europeísta, que é um continente aberto ao mundo. Deve repensar a sua política internacional, porque muito do que está a acontecer no mundo, o que faz com que milhões queiram chegar à Europa, resultam de erros da política internacional da União Europeia que é preciso corrigir, para que estas circunstâncias não se repitam e as pessoas se realizem nos seus territórios de origem. Mas para as que querem vir, é preciso criar um conjunto de regras, desde logo para a proteção dessas pessoas. O que temos dito é que as regras ao nível da imigração são essencialmente para proteger os próprios imigrantes, que chegam a um país com uma certa dose de ilusão, que depois não se concretiza porque o país não lhe proporciona. Isto é que faz engrossar a fileira dos que dormem na rua, dos desempregados e dos que são explorados por entidades patronais, que não têm atitudes éticas e morais.

Este Pacto é, então, no seu entender, um ponto de partida?

É isso mesmo. Há uma expressão que diz que é preciso um pé na porta para não a deixar fechar e este pacto é isso mesmo. Não deixar vingar a ideia que a Europa se fecha aos que vêm de fora. O meu compromisso nesta matéria é revisitar esse acordo, criar condições para que ele seja melhorado… Há muitos aspetos que não concordamos, mas é preciso ter coragem de pegar no assunto com realismo e sem extremismos.

Este tema, o da migração, agrada-lhe pelo desafio?

O desafio e o humanismo. Mas o desafio, de facto sim, porque há dois temas estruturantes, que é o da defesa, e aqui faço um parêntesis porque a defesa também tem a ver com Famalicão. E eu explico porquê. Quando se fala em indústria militar as pessoas pensam logo nas armas, nas balas mas é muito mais do que isso. É a logística, é o vestuário, calçado, tecnologia. E atenção, é um setor que vai consumir 2% do orçamento dos países membros, o que é muito dinheiro. Se Portugal estiver atento e for diligente, do ponto de vista industrial pode ter uma posição digna.

Voltando às migrações, é um desafio porque é um tema atual, afeta as pessoas. Por outro lado, é um tema muito propenso a populismos. Há uma associação que se tem feito entre migrações e criminalidade e os números não demonstram nada disso, é preciso combater esse anátema que as redes sociais têm alimentado e é preciso um discurso realista, correto, ponderado, racional. Procurarei ter esse discurso, mas também o lado do humanismo, porque acreditando que o meu exercício autárquico veio aprofundar este meu lado humano – Famalicão é um território onde as políticas sociais foram implementadas – entendo que esse meu percurso e formação também podem contribuir para a melhoria dessas políticas.

E que lugar ocupará Famalicão nesta sua nova vivência europeia?

Famalicão vai comigo na bagagem. É bom notar que eu não vou emigrar. Vou estar três a quatro dias por semana fora do meu país, mas nos restantes vou estar no meu concelho. Vivo em Famalicão, a minha família vive em Famalicão e por isso o centro, o eixo da minha roda será sempre Famalicão. O meu concelho e a minha região estarão sempre no centro da minha ação.

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