Famalicão
O jovem que trocou a música pela arte de costurar

Por entre as profissões que resistem ao passar do tempo no concelho de Famalicão, esta semana fomos ao encontro da Alfaiataria. No passado dia 23 de julho, a celebração do Dia Internacional do Alfaiate e da Modista foi uma chamada de atenção para que, num mundo de produção em massa e de moda efémera, ainda existem mãos que, com arte e paciência, transformam tecidos em identidade, em histórias, em sonhos concretizados. Este é um olhar sobre a alma que se esconde por trás de cada ponto, de cada corte, de cada peça feita à medida.
Na vila de Joane, uma pequena oficina de vestuário feito à mão é um testemunho vivo da persistência. Há mais de 40 anos, Alcino Machado e a sua esposa deram vida a este espaço, quase por acaso, como o próprio Alcino recorda: “Eu comecei nesta profissão há cerca de 40 anos e não foi de projeto, foi pensado. Deu-se sobre o caso de eu trabalhar numa camisaria e a minha esposa ter habilidade para a costura, experimentamos fazer uma camisa. E essa camisa foi para um familiar e depois, outros quiseram, e também os amigos deles, e assim começou.”

Tiago deixou a música e dedicou-se ao negócio dos pais
O que começou como uma experiência despretensiosa, tornou-se uma vida inteira dedicada às linhas e aos tecidos. Hoje, o legado continua pelas mãos do filho, Tiago Machado. A sua chegada à costura foi, também ela, inesperada. Vindo do mundo da música, Tiago encontrou no negócio da família um novo propósito: “uma circunstância da minha vida fez com que na altura decidisse abandonar a minha profissão (músico) e da qual estava um bocado cansado, e senti que os meus pais precisavam de uma ajuda aqui no negócio e que era um desafio novo para mim e que eu também gosto de desafios.”
Esta transição, que para muitos poderia parecer abrupta, revela uma profunda conexão com a arte. O gosto pela costura, que não era inato, foi-se desenvolvendo. Tiago descreve como a paixão foi crescendo. “Durante muitos anos aqui andava a brincar com os botões, com as linhas, mas nunca pensei que pudesse seguir os passos dos meus pais. Foi algo que foi derivado às circunstâncias da altura da minha vida profissional e, agora sim, passados 10 anos, a paixão já me corre nas veias.”
A tecnologia como aliada
Com a nova geração, não só o amor pela arte ganhou força, mas também a inovação. Tiago trouxe consigo uma visão moderna para um ofício ancestral. As redes de comunicação, ausentes nos tempos do seu pai, foram implementadas para expandir horizontes. “implementei, desde as redes sociais até ao nosso site, em que as pessoas podem fazer todo o processo de escolha de uma camisa à medida, no site e que podem ter esse serviço online. E nessa vertente, a gente conseguiu aliar a parte tecnológica a um serviço que é bastante artesanal”, explica Tiago.
Esta fusão entre o artesanal e o digital é a chave para a sobrevivência de muitas artes tradicionais. A tecnologia não substitui a habilidade das mãos, mas amplifica o seu alcance, ligando criadores a clientes de formas, até agora, impensáveis.
Dar vida a sonhos: a paixão de Alexandra Silva

Noutro ponto do concelho de Famalicão, a reportagem do OPINIÃO PÚBLICA encontrou Alexandra Silva, uma modista e formadora que personifica a paixão pela costura. O que começou como um hobby, tornou-se uma vocação: “Eu resolvi tirar uma formação para fazer algumas peças para mim, para ver se gostava, e as coisas foram surgindo.”
Alexandra desmistifica a ideia de que a costura é uma arte em declínio, destacando o renovado interesse das novas gerações: “Ao contrário daquilo que a maior parte das pessoas acha e que tem ideia, hoje em dia, há muita procura deste tipo de atividade. Os jovens estão a voltar, não só à costura, como também a outro tipo de atividades que eram consideradas menores e que hoje em dia estão a ser cada vez mais valorizadas.”
Para Alexandra, a costura é muito mais do que a união de tecidos; é a arte de dar vida a sonhos. Ela expressa esta filosofia de forma poética: “Quando eu entrego um vestido, eu entrego um sonho. Não entrego só a peça. A pessoa para ficar satisfeita, leva o sonho com ela de uma forma concretizada.”
Esta é a essência do trabalho do alfaiate e da modista: transformar a matéria-prima em algo que evoca emoções, que materializa aspirações. Mesmo na era digital, o trabalho manual, a dedicação e o amor pelo ofício continuam a ter um valor inestimável. A persistência de Alcino e o gosto que ainda o prendem à oficina, mesmo estando a ajudar o filho, são o eco de uma vida de dedicação.
