Opinião
Jorge Carvalho
Se há pessoas que na vida geraram uma relação pública de amor/ódio, posso arriscar dizer pelo que conheci e privei, uma delas terá sido o Senhor Jorge Carvalho, a quem hoje, através destas linhas, rendo homenagem pela sua passagem para a eternidade.
Falo, exclusivamente, da sua atividade cívica com a qual interagi vários anos.
A primeira imagem a seu respeito está gravada na minha mente há cerca de 60 anos, quando mal o conhecia; o senhor Camilo Angelino, figura típica do Louro que, pelo seu aspeto esfarrapado, de trouxa às costas e por um mau e doentio hábito que tinha de atirar pedras ao ar e de as aparar na cabeça (assim mesmo), incutia muito medo às crianças; nunca tinha visto um adulto impedi-lo de o fazer, até que pelos meus 14 anos, em dia de procissão de S. António, enquanto esta se organizava, muitas dezenas de pessoas ocupando a estrada – quase sem carros que também passavam poucos, numa roda junto à capela, assistiam ao “espetáculo”; uns com medo, outros não se envolvendo, Camilo lá se exibia e a cada pedrada limpava a cabeça com a mão e lambia o sangue, até que aparece Jorge Carvalho, bem vestido – um senhor – e lhe ordena aproximando-se: acaba imediatamente com isso. E foi obedecido, perante o silêncio geral!
Cerca de 10 anos mais tarde passamos a privar e muito, na sequência do 25 de Abril!
Jorge Carvalho foi um dos ativistas do movimento cívico do Louro que pretendia ser protagonista das transformações democráticas e resolução de carências que se estavam a operar no país e, por via disso, em cada uma das freguesias, instalando uma Comissão Administrativa da Junta de Freguesia. O Senhor Jorge já sabia ao que ia pois, segundo nos contava, tinha participado na campanha eleitoral de Humberto Delgado às presidenciais de 8 de junho de 1958, como independente, representando a oposição democrática.
Muito jovem, com cerca de 18 anos, terá sido um dos muitos milhares de portugueses que aderiram à campanha democrática entusiasmados com a célebre frase de Delgado, proferida a 10 de maio de 1958, em resposta a um jornalista, se fosse eleito presidente o que faria a Salazar? “Obviamente, demito-o”!
Carvalho, com persistência e engenho, olhando pouco a meios lá acabou nomeado, em 1975, “como escolha do povo do Louro”, para a presidência da Comissão Administrativa da Junta, já fortemente integrado e enraizado no PPD e ganhou as eleições e a presidência da junta nos 3 primeiros mandatos autárquicos, de 3 anos cada.
Posteriormente, com o prestígio das presidências da junta e com a obra feita, com o capital de sucesso na concelhia popular democrática e com a amizade pessoal e na presidência de Armindo Costa acedeu, naturalmente, à vereação municipal, passando a ocupar pelouros de grande relevância e impacto na evolução viária e obras do concelho.
Muito respeitado por todos os presidentes de junta, juntava esse “capital” de apoios para mais se afirmar na vereação. Porém, já no segundo mandato, havia mais vereadores a quererem protagonismo e dá-se uma cisão que leva à quebra da amizade e da confiança política entre Armindo Costa e Jorge Carvalho, passando este a “independente”, causando muitos engulhos na maioria municipal no desenrolar do mandato.
Jorge Carvalho foi assim afastado de concorrer a um novo mandato pelo PPD e sujeito a muitas vicissitudes, passando civicamente a “refugiar-se” quase exclusivamente na “sua” Creche e Jardim de Infância Dona Elzira Cupertino de Miranda.
No período democrático foi sempre gerador de obras, consensos e polémicas, consoante o ponto de vista, mas não restam dúvidas que ao deixar-nos, há dias, goste-se ou não, deixou-nos uma significativa, talvez impar marca de cidadania que perdurará por longos anos.
À família enlutada deixo os meus sinceros sentimentos. Até sempre, Jorge…
- Famalicãohá 4 dias
Central fotovoltaica de Outiz ganha forma e causa indignação
- Famalicãohá 4 dias
Famalicão doou mais de 19 toneladas de bens para o Banco Alimentar
- Sociedadehá 1 semana
Famalicão entrega diplomas a 211 adultos que concluíram o processo de RVCC
- Culturahá 4 dias
Cineclube exibe “Megalopolis” na Casa das Artes de Famalicão