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Famalicão

Leonel Rocha: “Saio com esta satisfação de dever cumprido”

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Em entrevista ao OPINIÃO PUBLICA, o vereador da Educação da Câmara de Famalicão, fala, sobretudo, das exigências e dificuldades que a pandemia de Covid 19 trouxe. Leonel Rocha frisa que, apesar da tarefa não ser fácil, toda a comunidade escolar, com o apoio da autarquia, tem-se superado largamente na tarefa. Nesta entrevista, o autarca fala ainda sobre as mudanças que a Carta Educativa preconiza e faz, depois de 16 anos como vereador da Educação, um balanço, antes da sua saída do cargo.

Passado um ano continuamos a viver tempos de grande exigência e com grandes mutações. A Educação foi a área que provavelmente mais sentiu a chegada da pandemia, com o encerramento das escolas, que colocou, duas vezes, milhares de alunos em casa. Em Famalicão, qual o balanço que faz da fase da adaptação dos professores, alunos e comunidade escolar aos dois confinamentos?

Por aquilo que consegui perceber e acompanhar, acho que as escolas deram uma boa resposta à situação. Os professores, efetivamente, continuaram a fazer um acompanhamento aos alunos, naturalmente, sempre ligados às condições que dispunham e, se na primeira fase, tivemos de socorrer a muitas situações, tivemos que chegar aos alunos de todas as maneiras e com os dispositivos que eles dispunham, na segunda fase os professores já estavam mais preparados e já conseguiram entrar de uma forma mais síncrona e com mais tempo. Esta foi uma boa resposta sempre dentro da contingência, sempre dentro da circunstância porque a melhor resposta é sempre presencialmente.

Portanto, os alunos à distância não deixaram de aprender e esses mesmos alunos, à distância não aprenderam tão bem como se fosse presencialmente, como é obvio.

Nessa perspetiva, faço um balanço positivo da adaptação dos professores e não é um balanço tão positivo na questão da aprendizagem porque, quando esta é presencial é, claramente, mais consolidada do que quando é à distância. À distância não é possível interagir diretamente com os alunos, até porque a maior parte das vezes estão com a câmara desligada, não é possível apurar as dificuldades que os alunos vão sentindo, bem como os problemas que eles vão transmitindo na sua expressão corporal e, por isso, há muita coisa que acaba por ficar para trás e acaba por condicionar a aprendizagem.

No que diz respeito em conseguir dar a melhor resposta perante a circunstância, é positivo porque as escolas fizeram um excelente trabalho e acho que, apesar de tudo, conseguimos continuar este desafio do ensino à distância.

De forma faseada, e desde março, que os alunos começaram a regressar à escola. Qual é o feedback que tem deste regresso por parte das escolas?

Efetivamente, com o regresso passou a haver maior normalidade. Os alunos vieram com alegria e com mais vontade de aprender. As aprendizagens estão a consolidar-se. Estão as escolas a ter o cuidado de sistematizar, de consolidar aprendizagens que foram feitas no tempo do ensino à distância, para que se consolidem. Acho nesse aspeto que as coisas estão a correr muito bem.

Naturalmente que numa situação que as pessoas não sabem nem dominam ao certo todas as circunstâncias e variáveis, cria sempre algum receio. Para alunos, professores, funcionários, direções é sempre natural isso acontecer. Mas, posso dizê-lo com propriedade que as nossas escolas estiveram à altura do acontecimento e prepararam-se bem para o regresso dos alunos e estão a ser capazes de olhar para todas as dificuldades que o ensino à distância trouxe e tentar dar a melhor resposta para que os alunos não fiquem para trás.

Do que consegue percecionar, desde março deste ano quantos focos de Covid 19 existiram ou existem nas escolas famalicenses?

Não temos diretamente estes dados. Estes dados são reportados à Saúde, mas temos tido feedback de que temos tido alguma interrupção em algumas turmas porque vai aparecendo um ou outro caso de Covid 19. Contudo, no contexto geral, podemos dizer que esta incidência não é tão grande quanto, porventura, esperávamos que pudesse ser. Isto significa que as coisas estão a correr muito bem. E depois há aqui uma nota que é importante dar: os casos que têm acontecido, efetivamente, não há registo de que surgiram no contexto escola. Ou seja, mesmo quando testam os alunos depois de detetar um caso, e testam os alunos e professores que estiveram nessa sala, não tem havido casos de contágio. Significa que as regras estão a ser bem cumpridas e os casos vêm de fora: do contexto da família e da sociedade, mas no contexto da escola não tem havido focos de transmissão.

De que forma o município famalicense, que é dos poucos que faz parte do programa Aproximar, ajudou e ajuda os agrupamentos escolares nesta fase tão exigente?

O município tem um trabalho com as escolas que eu não me canso de o referir que é o trabalho em rede. E desde logo isto fez uma diferença enorme, porque o facto de juntarmos com assiduidade os diretores das escolas num grupo com o município onde, em conjunto, discutíamos os problemas e procurávamos encontrar soluções, fez com que esta situação de pandemia fosse mais facilmente mitigada, ultrapassada e houvesse respostas mais eficazes. Porque os diretores, entre si e por si, fizeram uma partilha de práticas e isso ajudou imenso a que essas escolas fossem implementando essas práticas; e também fomos, em conjunto, detetando os problemas mais prementes e que as escolas tinham maior dificuldade em resolver e que o município podia ajudar. Uma dessas dificuldades teve a ver com os dispositivos eletrónicos para as crianças e do acesso à internet. O município supriu os problemas da internet a todos os alunos e em relação aos dispositivos eletrónicos – tablets e computadores – fomos, sempre com as escolas, fazendo um planeamento, a começar sempre pelos mais velhos, para consolidar aprendizagens até porque têm exames e fazer continuidade de estudos que dependem dessas aprendizagens. Com os mais novos fomos encontrando as melhores soluções de entre as possíveis.

Se não houvesse esta proximidade entre o município e as escolas, fruto deste programa Aproximar, mas muito mais fruto do trabalho em rede que fomos desenvolvendo, não era possível encontrar muitas das soluções que encontramos. Também referir que as escolas estiveram num grupo chamado de Grupo de Emergência Social do Município de Vila Nova de Famalicão, onde estavam outras entidades da Linha da Frente e, dentro deste grupo também foi possível ora antecipar problemas ora encontrar soluções para os mesmos. Portanto, neste aspeto, Famalicão por ter este trabalho organizado beneficiou e conseguiu dar as melhores respostas à situação de pandemia.

Como avalia todas as medidas tomadas pelo Ministério da Educação desde que a pandemia começou em Portugal? Foram assertivas?

Em primeiro lugar, afirmo que não sou dos que tenho de condenar o governo por tudo, porque a situação não é fácil de resolver. Que seria possível fazer melhor? Eu acho que sim. Houve situações que poderiam ter sido evitadas e o que coloco em cima da mesa é sabíamos que na primeira vez tivemos um problema com a questão dos tablets, computadores, etc., sabíamos que isto, mais tarde ou mais cedo, iria voltar a acontecer e os primeiros computadores chegaram já depois da segunda fase da pandemia. Isto não faz sentido. Era possível um planeamento melhor, mas sei que isto iria bater sempre no mesmo problema que é dinheiro…

Em setembro passado, a dias do regresso à escola de 15 mil alunos famalicenses, elogiou os agrupamentos escolares do concelho, que tiverem um “desafio tremendo” para arranjar soluções, tendo em conta esta pandemia. Foi efetivamente um desafio que não tem comparação…

Efetivamente, um desafio que não tem comparação! A resposta está mesmo aí. Nós, nestes 20 anos de autarca – e falo por mim – nunca tivemos uma situação tão difícil como esta. Nunca enfrentamos problemas tão difíceis de solucionar. Não houve aviso prévio. Foram numa dimensão enormíssima, porque não implicava a questão da escola, mas implicava também a questão das famílias e a questão social da nossa comunidade. E tudo isto agravado do facto de estarmos a vir de uma crise e esta pandemia acentuar imediatamente outra crise, com mais desemprego e outras carências. Foi uma situação difícil. Difícil nas escolas porque, dentro das suas condições disponíveis, tiveram de se reinventar para responder a uma situação completamente anormal, com regras difíceis de implementar num contexto do que já tinham. Mas, mesmo assim, foram capazes de dar uma boa resposta a este desafio e, efetivamente, foi um desafio tremendo!

A Carta Educativa de Famalicão foi aprovada há dias em reunião de Câmara. Quais são as grandes novidades que prevê?

Desde logo, esta Carta Educativa é mais exaustiva na análise e na previsão do percurso escolar dos alunos, porque começa logo na gênese e vai aos números da creche. Ou seja, quantos alunos temos e quantos espaços de creche dispomos. Chegamos à conclusão clara que sendo superior à média nacional e à média do Norte, nós ainda temos necessidade de lugares de creche. Isto está definido na Carta Educativa.

Uma outra novidade desta Carta Educativa é o facto de ter também uma análise fina e mais cuidada da caracterização das pessoas que trabalham nas escolas, quer os auxiliares e pessoal técnico quer os professores. E também chegamos à conclusão de que, nomeadamente nos professores, é uma população escolar muito envelhecida e que, dentro de alguns anos, vamos detetar problemas na substituição de professores. Podemos cair naquele problema que tivemos há alguns anos, aquando a massificação do ensino, de ter de recrutar professores que não são professores ou são de outras áreas. Isso não é necessariamente bom para o ensino e esta análise poderá ajudar a fazer reflexão para o futuro.

Há também a questão das obras necessárias na rede escolar…

A Carta Educativa abrange também a previsão da reorganização do território escolar e à necessidade de obras no contexto das escolas. Aqui, a principal mudança que se opera tem a ver com a consolidação do que está já a acontecer neste momento no terreno. Disto são exemplo as escolas de Ruivães e de Castelões que pertencem ao Agrupamento de Escolas de Pedome, mas cujos alunos, no final do 4º ano, fazem a sequencialidade dos seus estudos em Joane. Efetivamente, o Agrupamento de Pedome não consegue absorver todos os alunos do seu território, pelo que, então, estas duas freguesias vão passar para o Agrupamento de Escolas Padre Benjamim Salgado.

Depois em relação às necessidades de intervenções, naturalmente, temos as intervenções da Escola Secundária de Joane, a das EB 2,3 – a de Ribeirão já está em curso – a de Júlio Brandão e a de Bernardino Machado. Uma vez que as outras escolas, ou já foram intervencionadas porque já pertencem ao município (Nuno Simões, Gondifelos, Pedome, Arnoso e D. Maria II) ou vão ser intervencionadas este ano. Por isso, aos poucos, o Município está a colocar estas escolas com as condições que elas precisam.  

A Secundária e a EB 2,3 de Joane, bem como a Júlio Brandão, não são da responsabilidade do município e por isso, como o governo não fez intervenção, o município está a desenvolver esforços para articular com o governo essa intervenção e a planear para que se possa realizar aproveitando, porventura, os fundos comunitários que virão no 20/30.

Em relação às escolas do 1º ciclo que ainda faltam intervencionar, para além daquelas cujos projetos estão em fase de conclusão (Arnoso Santa Eulália que juntará o 1º ciclo com o pré-escolar na atual escola do 1º ciclo; Mões cuja escola será preparada para receber quatro turmas mas em boas condições; Avidos que, entretanto, já avançou o processo de obra e que dentro de dias começarão as obras), estamos a prever também a intervenção em Brufe que terá uma escola nova, que será um centro escolar que poderá acolher o 1º ciclo e o pré-escolar, juntando as duas escolas do 1º ciclo que estão dispersas (Lagarinhos e Carvalho) e o pré-escolar que atualmente também está separado das escolas do 1º ciclo.

Acrescento o Jardim de Infância de Bairro, bem como recordo que, em Avidos, as obras deverão iniciar-se em junho ou julho e Ribeirão em que as obras começam, efetivamente, em junho.

A Carta Educativa contempla também a existência de ensino público no terceiro ciclo e secundário em Riba de Ave. É uma forma de fazer pressão sobre o Governo para que isto se realize?

Na Carta Educativa também está contemplada a necessidade de ter um polo do ensino público do 3º ciclo e secundário em Riba de Ave. Isto não é nada mais nem nada menos do que sermos coerentes com a história, desde logo, porque aquela vila há 60 anos que dispunha destas valências de estudo e que, de um momento para o outro, ficou sem elas em termos públicos. E, por outro lado, para combater a evasão de famalicenses que estão a ir para o município vizinho de Santo Tirso, nomeadamente para Vila das Aves, porque é mais próximo ir para aí do que estar a ir para Pedome. Por isso, nomeadamente os alunos de Bairro e Delães que estão na fronteira com Vila das Aves estão a ir para lá em vez de irem para Pedome.

Se tivéssemos as valências do 3º ciclo e secundário em Riba de Ave, nós evitaríamos que os famalicenses tivessem de procurar noutro sítio.

Por isso, estamos a ser coerentes com a história, mas também a ser coerentes com aquilo que sempre defendemos. Portanto, quem criou este problema não foi o município, bem pelo contrário, e sempre defendemos que devia existir ali ensino público. Claro que, para o município era indiferente que fosse do ensino articulado ou estatal, mas, neste momento, claramente o que queremos é que seja do Estado, porque não vamos sequer pensar agora em voltar para trás. Concretamente, interessava que Riba de Ave tivesse um polo do Agrupamento de Escolas de Pedome.

Depois de estar 16 anos na vereação da Educação em Vila Nova de Famalicão, que balanço faz desta jornada?

Pode ser presunção estar a fazer o meu próprio balanço, mas como fui educado, desde pequeno, a fazer autoavaliação ou exame de consciência para podermos evoluir…. Olhando um pouco para trás, eu tenho, claramente, o sentimento do dever cumprido. Há 16 anos como vereador, deu para constatar a realidade e deu para eu me confrontar ao longo dos anos com problemas graves que existiam nas nossas escolas. No inicio, ainda era eu adjunto da vereadora, não tínhamos uma única escola do 1º ciclo requalificada e estávamos na fase de avançar com o pré-escolar em obras financiadas e com a obrigatoriedade da implementação do regime normal que obrigava a que houvessem cantinas. E nós, em 80 escolas tínhamos apenas seis cantinas. Foi um trabalho hercúleo.

A partir de 2005, tivemos de fazer um planeamento de intervenção e requalificação nas escolas. Foram obras de requalificação apetrechando as escolas para os tempos e as exigências de hoje. E hoje, podemo-nos orgulhar de dizer que o nosso parque escolar – ainda não estando completamente concluído, porque falta intervencionar as pequenas escolas que, por isso, ficaram para o fim – está muito bem apetrechado porque, aquelas escolas que puderam ser feitas com o financiamento estão feitas ou estão a fazer-se. Portanto, neste aspeto, sinto dever cumprido.

Iniciamos também um trabalho em rede com as escolas e que não existia até aí. Evoluímos a vários níveis. Foi importante este trabalho em rede, por exemplo, para a articulação do ensino profissional que, até com a formalização da rede local de educação e formação, em 2009, começamos esta concertação dos cursos profissionais. Em 2011, esta rede foi formalizada e em 2012 tínhamos já 50% dos alunos do 10º ano já estavam no ensino profissional. Portanto, foi muito rápido e foi estratégico este trabalho em rede.

Mas isto resultou também em outras áreas, concretamente, nos projetos educativos. Ou seja, nos projetos que se implementaram na escola e que acabaram por fazer a diferença no contexto dos resultados das escolas.

Este trabalho levou-nos a um reconhecimento, não só da comunidade. Fomos envolvendo, efetivamente, as comunidades educativas, no seu todo, no trabalho das escolas, fomentando o projeto educativo que mais tarde veio a resultar no plano estratégico da educação e fomentando os projetos educativos de cada escola, onde todos os agentes se pronunciassem e interviessem.

Mas há também outra vertente deste reconhecimento que é o facto de muitos municípios virem a Famalicão ver o nosso trabalho. Isso é também um bom indicador e algo que nos enche de orgulho.

Tenho um orgulho imenso na equipa da educação e, aliás, os resultados devem-se, essencialmente, a esta equipa que o município tem e ao trabalho em rede de todos os parceiros. Se algum mérito, como vereador eu tenho, é o de por esta gente a trabalhar em conjunto e de ter por missão fazer acontecer. Acho que isto tem dado bons frutos.

Por isso, saio com esta satisfação de dever cumprido e saio, claramente, desejando que este trabalho em rede e de proximidade continue e se intensifique.

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